12 dezembro 2007

Ansiedade?


A minha ansiedade aumenta na medida em que tenho menos tempo OU meu tempo torna-se mais escasso na medida em que fico mais ansiosa? Na verdade não importa se Tostines é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho. Sempre fui ansiosa ou, falando de outro jeito, nunca tive paciência de esperar. Talvez essa minha impaciência tenha começado junto com as viagens de férias que fazia à casa de meus avós. Eram seis horas dentro do ônibus (tá, comparado àqueles que viajam de São Paulo ao Ceará isso é fichinha) e isso para uma criança de uns 4 anos que passava mal e vomitava a viagem toda, era um martírio. Martírio esse compartilhado com meus pais, é claro. Primeiro agüentavam as minhas incessantes perguntas : Estamos longe? Já estamos chegando? Falta quanto?, e depois, bem, se vocês tiverem um filho que passe mal em viagens saberão do que estou falando.

Também nunca tive paciência para trabalhos manuais. Eu queria ver a coisa pronta e não ter que fazer com calma até ficar pronto. Por isso nunca cheguei ao fim de uma escultura de papel machê, nunca consegui passar do estágio da correntinha no crochê e nunca cozinhei bem. Esperar 45 minutos para assar um bolo era demais para mim. Teve um tempo em que eu vivia em função do que iria acontecer a seguir. Por exemplo, tinha uma festa para ir no sábado e hoje ainda era terça, o que acontecia? Ficava pensando na festa a semana toda. Para as crianças isso não é tão prejudicial assim pois na infância o tempo demora bem mais a passar. O problema é quanto nos tornamos adultos, e pior ainda, adultos na era digital.

Como hoje tudo acontece mais rápido, tendemos a acelerar cada vez mais nossas vidas. Antes você escrevia uma carta, colocava-a dentro de um envelope, grudava um selo (um tipo de adesivo colorido que servia para provar que você estava pagando pela postagem) e dirijia-se até a caixa do correio (um grande receptáculo amarelo geralmente de plástico ou policarbonato com uma fenda na frente por onde eram colocados os envelopes). Essa carta então levava uns dois ou três dias para chegar ao seu destino se você morasse razoavelmente perto do destinatário. E a resposta? Bom, demorava uma semana, uma semana e meia mas sempre chegava. Hoje é assim: “Mas eu te mandei esse e-mail há 5 minutos! Por que você ainda não respondeu?”

Com essa super aceleração da comunicação e das relações acabamos querendo fazer mais coisas do que realmente conseguimos. Com isso surge o outro lado da moeda, a procastinação*. Por ser tudo bem mais fácil e mais rápido e por termos muito mais coisas a fazer acabamos negligenciando nossas tarefas, sejam elas profissionais ou pessoais. É tão simples emitir uma declaração pela internet ou enviar aquela mensagem, por que não deixamos para depois, e depois, e depois? O problema é que esse depois vira vício. Temos meios muito eficientes para desempenhar nossas tarefas mas por eles serem assim, tão eficientes, acabamos deixando tudo para mais tarde. Quando nos damos conta está tudo em cima da hora.

Seria a solução, tanto da ansiedade quanto da procastinação, a desaceleração? Acho que sim. Se pisamos no freio e vivemos uma coisa de cada vez conseguimos controlar a ansiedade. Se controlamos a ansiedade e damos atenção àquilo que estamos vivendo agora, diminuímos os nossos atrasos constantes. Mas não é fácil desacelerar em mundo onde todos querem tudo para ontem.


* deixar para amanhã, postergar.
Foto: Flickr - Álbum de Tataughina

11 dezembro 2007

A Alma Imoral


Assistido por mais de 50 mil pessoas, A Alma Imoral é uma adaptação de Clarice Niskier para o teatro do livro homônimo do rabino Nilton Bonder. Com humor fino e delicadeza, a atriz e dramaturga – vencedora do Prêmio Shell 2007, melhor atriz – coloca em cena as reflexões do rabino sobre o certo e o errado, a obediência e a desobediência, as fidelidades e as traições através de histórias e parábolas judaicas. A partir de narrativas ancestrais, Clarice leva o espectador a percorrer o caminho defendido pelo rabino, de que é preciso transgredir para evoluir. Segundo o pensamento de Nilton Bonder, “não existe tradição sem traição, duas palavras de escrita e fonética tão semelhantes em nossa língua quanto o são interligadas em seu significado mais profundo". É a partir desta idéia que a Alma Imoral propõe uma nova forma de olhar. Um olhar que pressupõe o entendimento de que toda moeda tem o seu reverso, que os opostos são absolutamente necessários, que a obsessão pela fidelidade e tradições inviabiliza a possibilidade de novos caminhos.



Teatro da Caixa – Rua Conselheiro Laurindo, 280 tel 2118 5111
www.caixacultural.com.br classificação 18 anos

APRESENTAÇÕES:
7, 8, 9, 14, 15 e 16 de dezembro – sexta e sábado 21h – domingo 19h

Fonte : Divulgação Caixa Cultural
Fotos: site da peça

Por indicação de um colega assisti à peça no último sábado. Muitas das coisas que vi e ouvi lá estão ainda na minha cabeça (ou seria na minha alma?) mas passá-las para o papel não é tarefa fácil portanto recomendo que assistam. Mas mais que uma peça a ser assistida, ela é uma peça para ser sentida. Sei que prometi a uma pessoa que escreveria minhas impressões sobre ela mas como disse, não é tarefa fácil. O texto veio de encontro com algumas coisas que eu já tinha em mente e lançou mais algumas dúvidas. O que é certo? O certo é o correto? Será que estou conduzindo minha vida da maneira que ela deve ser conduzida? Ainda não sei as respostas (nem sei ainda todas as perguntas!) mas sei que essa peça mexeu comigo e provavelmente com boa parte daqueles que estavam no teatro, cada um a sua maneira.

Estava ouvindo agora a música feita para A Alma Imoral e ela me levou de volta àquele clima intimista, desafiador mas ao mesmo tempo aconchegante. A vontade de repetir a dose no próximo fim de semana é bem grande.

Gostei bastante do texto, então comprei também o livro.

Não há tradição sem traição. Não há traição sem tradição.